ESPECIAL: “Ninguém manda nessa nega!” O recado dado por Tia Eron é lembrado até hoje como uma marca de independência e coragem.

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Foto: arquivo
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A frase ecoou o Brasil, e como um nó que estava preso na garganta, muitas mulheres também gritaram juntas: “ninguém manda nessa nega!”. De um recado dado, em junho de 2016, pela Deputada Federal Tia Eron aos seus pares, no momento decisivo da votação para cassação do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, a frase se tornou marca, uma bandeira, para todas que não se calam, intimidam em situações de desafio, mas que vence com a coragem, bravura, independência, respeito e lealdade aos seus valores e história.

História que lá no século 18, uma mulher negra, certamente também teve que dizer que ninguém lhe mandava. Com a morte do companheiro, Tereza de Benguela se tornou a rainha do quilombo, e, sob sua liderança, a comunidade negra e indígena resistiu à escravidão por duas décadas, sobrevivendo até 1770, quando o quilombo foi destruído pelas forças de Luiz Pinto de Souza Coutinho e a população (79 negros e 30 índios), morta ou aprisionada.

A resistência, a personalidade marcante desta mulher, rendeu o Dia Nacional dedicado a ela e da Mulher Negra, por meio da Lei 12987/2014. E antes disso, em 1992, em Santo Domingo, na República Dominicana, com a realização do 1º Encontro de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas, criação da Rede de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas e a definição do 25 de julho como Dia da Mulher Afro-latino-americana e Caribenha.

Um marco, para se orgulhar, mas sobretudo refletir. Ao longo dos anos, várias mulheres negras conquistaram e ainda conquistam posição de destaque pela luta e resistência e são: juristas, deputadas, prefeitas, medicas, professoras universitárias, jornalistas, modelos, artistas, empresarias. Mas, contudo, ainda enfrentam a violência (social, moral e física) patrocinada pelo desrespeito e racismo da população.

Já se tornou comum ver a atriz, Tais Araújo postar nas redes sociais, ato de racismo que sofre simplesmente por ser negra, mesmo apresentando uma carreira bem sucedida e ser uma referência no âmbito cultural, artístico do país.  A jornalista Maria Julia Coutinho, a Maju da previsão do tempo do Jornal Nacional, também foi alvo de xingamentos, agressões verbais nas redes sociais por ter a pele preta.

Nas estatísticas os números dão corpo a triste realidade. De acordo com o IBGE, em 2012, 49,9% das mulheres brancas tinham empregos formais e as negras apenas 34% e ainda com salários inferiores. Segundo a plataforma Géledes, 62% de vítimas de morte por agressão são mulheres negras. A pesquisa ainda mostra que 43% das mulheres negras foram assediadas na rua, transporte público ou ambiente de trabalho, enquanto 35% das mulheres brancas sofreram esse tipo de assédio.

O caminho, para as feministas negras não é apagar a dor e as diferenças, mas fazer delas o significado da luta! E cada conquista deve ser um reconhecimento.

A deputada federal, hoje licenciada, Tia Eron é Eronildes Vasconcelos Carvalho, de 45 anos, viúva, mãe de dois filhos que viveu a infância em um bairro pobre de Salvador. Ao se dedicar como professora da Escola Bíblica da Igreja Universal do Reino de Deus, ganhou o codinome (Tia Eron), a qual lhe popularizou na política.

Elegeu-se a primeira vereadora negra da capital baiana pelo antigo PFL em 2000. Reelegeu-se três vezes. Em 2012, ainda quando vereadora, ganhou o prêmio internacional Mulheres Distintas em Hartford, Connecticut, EUA. E em 2014 com mais de 116 mil votos, conquistou a vaga de deputada federal pelo PRB. Sua atuação parlamentar se concentra em apresentar projetos em favor de mulheres e negros, condizentes com sua história. No ano passado, foi homenageada em São Paulo, com o Troféu Raça Negra, condecoração concedida a personalidades que contribuem para a construção de uma sociedade plural por meio do combate ao preconceito, à intolerância e à discriminação.

Atualmente, Tia Eron ocupa o cargo de Secretária de Promoção Social e Combate à pobreza (SEMPS) na cidade de Salvador, buscando cuidar, valorizar, promover, incentivar por meio de programas e ações de políticas sociais, o povo negro, em especial, a mulher negra. Empoderando-a de que é possível vencer os desafios e continuar ecoando a voz da independência, da coragem e determinação, a fim de a sociedade respeitar e entender que ninguém manda nessa nega!

 

Carluze Barper /Jornalista

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